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De Blumenau aos bastidores da Fórmula 1: a trajetória de Alessandro de Carvalho na Red Bull Racing

Bora acelerar, com Ronan Kietzer.

22/12/2025 às 12h22
Por: Ronan Kietzer
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Foto: Arquivo
Foto: Arquivo

A Fórmula 1 é, para muitos, sinônimo de velocidade, glamour e grandes nomes do automobilismo mundial. Mas por trás de cada carro que entra na pista existe uma engrenagem humana e técnica extremamente complexa, formada por profissionais que raramente aparecem diante das câmeras. Um desses nomes é Alessandro de Carvalho, engenheiro dimensional da Red Bull Racing — e cuja trajetória profissional passa diretamente por Blumenau.

Alessandro tem 37 anos, nasceu em Guarulhos (SP) e cresceu em Caraguatatuba, no litoral norte de São Paulo. Toda a sua formação básica foi feita em escola pública, na mesma escola onde cursou do jardim de infância ao ensino médio. Um ambiente com poucos recursos, biblioteca limitada e professores que, muitas vezes, compravam livros com recursos próprios para garantir o aprendizado dos alunos.

Era também um contexto social difícil. Violência, drogas e criminalidade faziam parte do cotidiano. Muitos amigos ficaram pelo caminho. Alessandro cresceu convivendo com essa realidade, sempre muito próximo da linha entre escolhas certas e erradas. O que o manteve em outro caminho foram os princípios ensinados pelos pais e a clareza de que a educação seria sua principal ferramenta de transformação.

Blumenau como divisor de águas

Em 2008, Alessandro tomou uma decisão que mudaria completamente sua vida: mudar-se para Blumenau. Chegou à cidade justamente no período da enchente histórica que marcou Santa Catarina. Veio com pouco mais do que uma moto, algumas malas amarradas e um objetivo ainda em construção — tornar-se engenheiro mecânico.

Sem qualquer experiência prévia em mecânica, começou trabalhando como operador de máquina em uma pequena fábrica. A partir dali, iniciou sua formação técnica no CEDUP, onde aprendeu os fundamentos da mecânica. Foi em Blumenau que Alessandro construiu praticamente toda a base técnica que hoje utiliza na Fórmula 1.

Após o curso técnico, ingressou na graduação em Engenharia Mecânica como bolsista parcial em uma instituição privada. Paralelamente, trabalhou em diferentes indústrias e segmentos, passando por áreas como manufatura, usinagem, projeto e controle de qualidade. Cada etapa agregou conhecimento prático e visão de processo — algo que mais tarde se mostraria decisivo.

Além da atuação industrial, Alessandro viveu uma experiência que ele mesmo não imaginava: tornou-se professor técnico no CEDUP, onde havia sido aluno, e também no SENAI. O ensino foi uma quebra de barreira pessoal. Desenvolver a comunicação, transmitir conhecimento e formar novos profissionais ampliou não apenas sua visão técnica, mas também humana.

A Fórmula 1 como consequência, não como ponto de partida

Diferente do que muitos imaginam, a Fórmula 1 nunca foi um sonho de infância. Como grande parte dos brasileiros, Alessandro acompanhou o automobilismo na era Ayrton Senna, mas sua verdadeira paixão sempre esteve no trabalho técnico, não necessariamente nas corridas.

O que o levou à Fórmula 1 foi a dedicação a uma área extremamente específica da engenharia: engenharia dimensional, ligada à metrologia, precisão, controle dimensional e confiabilidade de componentes. Ao longo de mais de 15 anos, Alessandro se preparou para ser um profissional de excelência nesse campo, aprendendo com os melhores, acumulando experiências e aprofundando-se tecnicamente.

Quando se mudou para a Inglaterra, precisou recomeçar. Trabalhou como operador de torno, aprimorou o inglês, adaptou-se à cultura local e reconstruiu sua trajetória profissional praticamente do zero. Foi um período de ajustes, aprendizado e preparação silenciosa.

O caminho até a Red Bull Racing

Em 2022, durante um grande evento da Red Bull Racing em Milton Keynes, Alessandro teve um momento decisivo. Ao ver de perto a estrutura da equipe, afirmou à esposa que um dia trabalharia em uma equipe de Fórmula 1 — mesmo sem saber exatamente quando ou em qual delas.

A partir dali, iniciou um processo estratégico de preparação. Usou o LinkedIn para analisar o perfil de profissionais que já atuavam na Fórmula 1, identificou lacunas em sua formação e buscou especializações específicas. Aplicou diversas vezes para vagas em equipes da categoria e foi rejeitado repetidamente — não apenas pela Red Bull, mas por outras equipes também.

Em vez de desistir, analisava cada negativa, entendia o que faltava e voltava a estudar. O processo seletivo da Red Bull Racing é extremamente concorrido, com centenas de candidatos de diversos países para uma única vaga.

Quando finalmente foi selecionado, passou por três etapas rigorosas: uma entrevista on-line, uma visita presencial à fábrica e um teste prático altamente técnico. Nesse teste, Alessandro precisou criar, em poucas horas, um programa completo de medição a partir de um desenho técnico e de uma peça real da suspensão dianteira de um carro de Fórmula 1 — utilizando toda a experiência acumulada ao longo de mais de 15 anos.

Após etapas adicionais de documentação e procedimentos, veio a confirmação.

Bastidores da Fórmula 1: precisão absoluta

Um carro de Fórmula 1 pode conter entre 15 mil e 20 mil peças. Ao longo de uma temporada, esse mesmo carro pode receber cerca de 20 mil atualizações. Na área de qualidade e engenharia dimensional, o trabalho é garantir que cada componente seja intercambiável, preciso e confiável em todas as etapas da fabricação e montagem.

A pressão é constante. Os prazos são curtos, o nível de exigência é extremo e qualquer erro pode comprometer desempenho e resultados. Ainda assim, Alessandro descreve a Red Bull Racing como o melhor ambiente profissional onde já trabalhou.

Existe uma cultura forte de colaboração entre departamentos, troca de conhecimento e trabalho em equipe. Há espaço para desenvolver ideias, melhorar processos e contribuir ativamente para a evolução do carro — sempre com foco em desempenho, precisão e excelência.

Conselho para quem quer seguir esse caminho

Para quem sonha com uma carreira no automobilismo, especialmente nos bastidores, Alessandro é direto: foco em um objetivo, trabalho duro, valorização da experiência prática, domínio do inglês e especialização profunda na área de atuação.

Ele destaca ainda um diferencial importante dos profissionais brasileiros: a resiliência. Segundo Alessandro, as dificuldades enfrentadas ao longo da formação no Brasil criam profissionais altamente adaptáveis, comprometidos e valorizados por empresas na Inglaterra e na Europa.

Uma frase ensinada por um grande mentor resume sua visão profissional:

“As empresas contratam você pelas suas habilidades e conhecimentos, e te demitem pelas suas atitudes.”

Alessandro também cita dois filmes que considera inspiradores para quem deseja seguir esse tipo de trajetória: A Million Miles Away e Hidden Figures — histórias que reforçam a importância da persistência, do preparo e da superação silenciosa.

Uma história construída com constância

Antes de chegar à Fórmula 1, Alessandro foi garçom, empacotador de supermercado, atendente de padaria, motoboy, ajudante de barman, operador industrial e professor técnico. Cada uma dessas experiências contribuiu para formar o profissional que hoje atua na elite do automobilismo mundial.

Sua história mostra que a Fórmula 1 não é feita apenas de talentos visíveis, mas também de trajetórias silenciosas, construídas com constância, preparo e escolhas feitas ao longo do tempo.

E Blumenau faz parte essencial desse caminho.

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Ronan Kietzer
Sobre o blog/coluna
Blumenauense apaixonado por esporte a motor, acompanha de perto as principais competições. Com olhar atento e opinião afiada, assina a coluna no AJ Notícias trazendo bastidores, curiosidades e os grandes momentos do automobilismo. Fã da velocidade desde pequeno, Ronan compartilha sua paixão com quem vibra a cada volta na pista.

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